segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Carta para Gabriel

GABRIEL

Eu me lembro dos almoços de domingo na casa da minha mãe. Seus netos Flavia e Fabio, meus filhos, Gabriel e Nina, do Sergio e da Fátima, Amanda, da Belinha e Rafael, do Marinho, todos juntos.

Faziam a maior bagunça, mexiam em tudo,faziam muito barulho. Gabriel ficava na dele, lendo seus livros e todas as mães invejavam a Fátima,querendo saber o que fazer para ter um filho como o Gabriel.

Eu brincava com ele, cantando “Gabriel... Gabriel..., gosta de comer pastel...” e ele completava ... embrulhado no papel.... e olhando para o céu... e comendo pão de mel...

Gabriel cresceu e não decepcionou: suas leituras, sua inteligência e sua concentração se confirmaram nas excelentes notas desde o primário até a faculdade, nos primeiros lugares e nas portas que se abriram para seu crescimento na pós e mestrado. Ele surpreendeu mesmo, foi no seu vigor físico. Aquele garotinho magrela, desengonçado no futebol, era capaz de enfrentar qualquer adversidade, andando 5 dias a cavalo, atravessando as estepes geladas da Mongólia, andando de camelo, em pé, no deserto, com os beduínos, dormindo em Gers, com famílias mongóis. Era capaz de pegar 5 onibus, 2 trens e 2 barcos para atravessar o norte do Vietnam, Laos e Camboja para participar da festa de reveillon em Ko Paghan, ilha paradisíaca ao sul da Tailândia. Rodou de carona pelo Paquistão, Turquia e Jordânia.

Gabriel conheceu as principais cidades do mundo: Paris, Londres, Amsterdam, mas sentia que aquele não era seu lugar. Preferia as tabas indígenas da Amazônia, as aldeias do interior do Vietnan, as aldeiotas distantes do Afganistão e do Casaquistão, os vilarejos da Índia.

Lá ele tinha oportunidade de conhecer de perto a pobreza do mundo, matéria de seus estudos sobre a Economia da Pobreza. Gabriel não buscava informação, mas sim experiência. Ele gostava de viver como eles viviam, ajudando a regar as plantações de arroz no Vietnam, arando a terra na Índia, andando por 16 dias em trilhas pelo circuito de Anapuma, no Tibet. Comia a comida que eles comiam, dormia como eles dormiam. Gostava de se vestir como eles se vestiam.Tirou muitas fotos com trajes típicos. Fazia muitas amizades por onde passava, recebendo vários nomes: Chajian na China; GA no Vietnam; Tsen, na Tailândia e do seu amigo africano, da tribo massai, recebeu o nome de Lemaya.

O dinheiro que economizava em hotéis, ele usava para ajudar as famílias pobres com quem convivia. Mas não era questão de dar dinheiro. Ele participava. Sua maior alegria foi quando saiu com um menino pobre visitando várias escolas e na melhor delas, conversou com o diretor e pagou a matrícula e 1 ano de mensalidade escolar, avisando que se o menino lhe enviasse o boletim com boas notas, pagaria os anos seguintes. Tudo isso, lhe custou 42 dólares.

Amigo dos animais, brincava com macacos, dormia com jibóias, flertava com uma naja, corria atrás dos camelos no deserto para lhes montar em pelo, se divertia com os tigres. Sua maior paixão, no entanto, eram os elefantes. Ficava admirado quando eles lhe abraçavam com a tromba e o colocavam no dorso, para caminhar. Ele achava mais lento que os camelos, mas ficava feliz, pois era uma altura de quase 3 metros, uma queda feia.

Fruto de uma mistura de educações religiosas milenares, a cristã e a judaica, tinha no Amor seu guia, mas sabia que não bastava estudar e saber, sem praticar. Assim, seguia aprendendo e ajudando.

Aprendendo e ajudando, ele seguia caminhando. Como um Mahatma Ghandi, ou mesmo como um Forrest Gump, ele caminhava, caminhava, incansável na sua busca por conhecimento e pela pratica da caridade aos mais necessitados, não importando sua nacionalidade ou crença. Buscava sempre a D’us, e por isso, gostava de subir montanhas, talvez para se sentir mais perto dEle. Assim, subiu o Himalaia, o Fen Xi Pan, de 3100 m de altura, na Indochina, o Kilimanjaro, a Huan Shan, montanha sagrada do induísmo.

Acredita-se que os Jardins do Edem ficavam na África. Dizem que os primeiros homens eram da África. A África foi o lugar que Gabriel escolheu para terminar sua viagem. Em Malawi, resolveu subir o monte Mulanje. Subiu, subiu, cada vez mais perto do cume e do céu. Não precisava da sua mochila grande e a deixou no hotel; continuou subindo, subindo. Sua mochila pequena também não lhe fazia falta e a deixou no alojamento do parque; e foi subindo, subindo. Apesar de nunca ter estado lá, sabia o caminho e não precisava mais do guia, que retornou. Gabriel continuou subindo, subindo, até que em certo momento, sentiu que também não precisava mais do seu corpo. Assim, o colocou aninhado num cantinho da trilha e continuou subindo, subindo, subindo...

Vai, Gabriel, vai comer pastel.... lá no Céu.

Aproveita e manda um beijo para meu irmão, teu pai.

Guilherme

7 comentários:

  1. Linda carta, Guilherme, emocionou-me. Tenho certeza de que Gabriel a leu, lá de onde ele está, feliz, comendo pastel.
    Que Deus o tenha em seus braços, ele certamente devia ser uma pessoa pra lá de especial.
    Abraços à família e amigos, que Deus esteja com vocês.
    Helga

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  2. Lindo texto !!!! Esse rapaz cumpriu a missão dele. Ele está feliz !!!!
    Força para a família.
    Carla

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  3. A mais linda demonstração de amor... Que lindo texto.... Que lindo está o Céu....

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  4. Lindo, lindo, lindo! Dá vontade de subir também... Guilherme, que pessoa linda que você é!

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  5. sem palavras, muito lindo o texto...felicidade a do Gabriel de ter uma família que o compreendia tão bem em suas mais lindas missões.

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  6. claudia villela "samanturres"13 de setembro de 2009 às 01:57

    nao e atoa que sou sua mana tambem
    coracao grande vida afora e alem
    nao ha tempo nem espaco pra quem
    nunca esquece quem se quer bem

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  7. uma do gabucho: voces se lembram quando o sergio perguntou pra ele qual bicho de estimacao que ele queria... e o que ele respondeu?
    _uma galinha!!!
    (nos velhos tempos da samanturres)

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